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quinta-feira, 23 de julho de 2009

A aleatoriedade do gostar infantil

Alice entrou na fase do pânico de médicos. Bastou entrar num ambiente onde há uma cama de exames e uma pessoa de branco que ela já dispara a berrar. Em sua última consulta na pediatra não foi possível medí-la, e, pesá-la foi um trabalho herculeano. Isso porque ela gosta da pediatra dela... quer dizer, sempre gostou.
A pediatra a conhece desde pequena e já esteve com ela em diversas ocasiões fora do consultório. É amável e adora crianças. Tem uma paciência invejável. E nunca teve que examinar a Alice em situações de emergência, já que essas parecem só acontecer no período entre meia noite e 6 da manhã ou em finais de semana e feriados prolongados.
Não obstante, Alice morre de medo dela e se transforma em uma verdadeira artista contorcionista do Cirque de Soleil quando eu a levo para o exame de rotina.
Como se não bastasse esse pânico despropositado, em uma recente viagem ao interior de Minas ela deslocou o cotovelo (pronação dolorosa) e precisou de atendimento ortopédico de emergência em um hospital nada simpático com uma equipe que só fez forçar o cotovelo da menina até, finalmente, descobrirem que o problema era justamente o cotovelo. O ortopedista até foi hábil, mas, quando ele chegou, ela já estava aterrorizada pela situação e o trauma já tinha se instalado.
Pois bem, eis que no sábado à noite Alice, que vinha com um quadro gripal e uma febre leve, me aparece com uma febre de 38,5 e com dor de ouvido, o que me obriga a levá-la para uma consulta de emergência. Como as clínicas pediátricas estão entupidas de possíveis portadores da Gripe Suína, preferi ligar para o meu tio avô, um renomado otorrino que hoje já está com quase 90 anos e levá-la em sua casa, onde eu tinha a garantia de não encontrar o H1N1. Devo ressaltar que meu tio avô nunca foi muito fã de crianças pequenas.
Alice chegou lá um pouco molenga e ele a examinou. Ela, como de costume, gritou e se contorceu o quanto pode. Ele, ironicamente surdo por completo, não se afetou e continuou examinando com a maior tranquilidade do mundo. A surdez parecia o fazer imune ao stress causado pelos gritos e malcriações da Alice.
Fomos para casa com o diagnóstico feito. Um bloco de cera tinha se formado em seu ouvido em virtude do catarro que ali se acumulou e isso estava pressionando e causando dor. Solução? Pingar gotinhas para diluir a cera e ir ao consultório dele (que também está longe de ter risco de H1N1, já que hoje ele atende uma média de 3 pacientes/dia) para fazer a remoção da cera em 4 dias.
Na data marcada já acordei suando frio. Eu já previa o drama que seria a tal remoção da cera. Liguei para minha mãe e pedi que fosse comigo para me ajudar a segurar a fera contorcionista. Ela relutou, sabia que seria traumático para todos nós, mas, no seu papel de avó zelosa e mãe caridosa, concordou.
Chegamos ao consultório e a Alice já se ambientou. Andou pela sala de espera, disse oi para a secretária e declarou (depois de um pequeno treino por parte da mamãe) que estava ali para ver o tio "Beto" que iria ver o seu "bido". E logo depois completou que "nanão"!
Pronto, meu destino estava selado! Seria uma carnificina!
Chegou a hora do malfadado procedimento (que nada mais é do que a inserção de um pequeno tubinho na entrada do ouvido e a injeção de água morna para remover a cera, seguido de uma aspiração, também essa feita colocando um pequeno tubo na entrada do ouvido, e uma secagem com um algodão preso a uma haste, que se assemelha a um longo cotonete). Sentei na cadeira com a Alice no meu colo, já segurando ela firmemente. Ela ensaiou um choro e, como que por milagre parou e ficou quietinha.
Assim que a água foi injetada no ouvido ela relaxou e passou a deixar que ele fizesse tudo sem o menor esforço.
Procedimento terminado e ela deu um beijo com direito a upa no meu tio avô e fomos embora.
Qual não foi minha surpresa hoje, quando meu tio avô chegou na casa da minha mãe para um pequeno encontro de família e Alice o vê e exclama: "BETO!!!!"
Em seguida passa a contar para todo mundo, com um grande sorriso na cara, que "Beto vô bido" (*Roberto lavou o ouvido).
Agora, alguém me explica porque diabos o otorrino idoso que não gosta de crianças e enfiou tubinhos e água pelo ouvido da Alice se tornou tão amado e a pediatra doce e amável que só faz brincar com ela continua sendo tratada como a inimiga número um?

3 comentários:

  1. Tem coisas que ninguém explica...
    Nossos filhos nos lembram disso diariamente!

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  2. Com certeza nossos filhos sentem um cheiro de todas as emoções que nós podemos sentir. E a partir daí reagem da maneira que lhes for conveniente... E sua princesinha definitivamente acha que um senhor de quase 90 anos é beeeeem mais amistoso que a pediatra dela (e isso também é impressionante: meu filho adora todo e qualquer tipo e estilo de senhor idoso)

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  3. Hahahaha
    Bem, a AC tb gritava como se estivesse sendo espancada simplesmente ao ver que estacionávamos o carro em frente ao consultório do pediatra (que tb nunca fez nada que pudesse despertar esse pânico...)
    Para a minha surpresa, na ultima consulta ela se comportou super bem, deixou ser examinada, contando a todos que o titio é legal e deu "pililito" pra ela!
    Que a paz continue reinando em nossas consultas!

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